Foto: Davi
Danilo Nascimento aprendeu
a fotografar vendo o pôr do sol, o Rio São Francisco. E, hoje, seu
amadurecimento profissional também flui naturalmente. Captar uma imagem é
trocar energia com o objeto captado. Fotografia se transforma em história.
Radicado em Belo
Horizonte – mas ainda fortemente ligado a sua raiz, Pirapora –, nesta
entrevista, Danilo submerge aos níveis profundos de seu ofício: o aprendizado
trocado entre espaço, indivíduo e fotografia; a dimensão política; suas origens; a perspectiva, materializada em imagem, de quem mora
longe do lugar que ama; a compreensão de que o fotógrafo é testemunha do seu
lugar e do seu tempo. Deste mergulho, ele emerge para apontar a necessidade de
mudança. A fotografia pode transformar o mundo.
Danilo,
a fotografia captura instantes. O que apenas um instante revela sobre o lugar,
sobre a pessoa fotografada?
A fotografia tida como
um instante congelado no tempo sempre revela um conjunto de sentimentos e
energia trocados entre o objeto (lugar ou a pessoa) e eu. Por isso cada imagem
revela a minha energia pessoal em interação com a energia do objeto
fotografado. Se não estivermos em sintonia, provavelmente não teremos boas
fotos.
Você
tanto se dedica à captura de imagens que acontecem por si mesmas, as imagens
espontâneas, quanto à captura de imagens manipuladas pelo seu olhar. O que te
dá mais prazer em fotografar? Quais as diferenças?
As imagens espontâneas
são as mais interessantes e as que mais gosto de fazer. Tenho um projeto
chamado Citadino que tem essa
proposta de observar as relações pessoais no meio urbano sem pré-conceitos e
julgamentos, como alguém que está invisível e inserido nesse meio sem ser
notado, não influenciando em nada. Esse trabalho é um dos que mais tenho me
dedicado no momento. A diferença entre a fotografia espontânea e aquela em que
podemos manipular o objeto fotografado (retrato, em caso de pessoas) está na
beleza do inesperado. Quando as pessoas sabem que são fotografadas, elas se
preparam para o retrato, então já não são naturais. Entretanto, quando elas não
sabem da foto, a ação natural prevalece, revelando a magia da ação espontânea.
Da série Citadino
O
que te despertou para a fotografia?
A beleza da natureza
despertou a fotografia em mim. A vontade de eternizar cada imagem bela que se
forma nos fenômenos naturais. Sempre gostei de fotografar paisagens, em
especial, pores do sol. A fotografia surgiu como uma fuga do estresse.
E
hoje, por que ainda fotografa?
A motivação já é outra,
não é somente um refúgio. Tenho um compromisso em tornar melhor o universo em
que vivo. Busco impactar as pessoas com minhas fotos, ora pela simples beleza
de uma imagem, ora pelo incômodo de temas polêmicos que tiram a mente dos
espectadores do conforto de uma falsa sensação de que apenas pela fé podemos
tornar o mundo melhor e que tudo pode ser revertido quando quisermos. Fotografo
ainda hoje porque eu busco a mudança do mundo, e se eu conseguir acender uma
pequena centelha no pensamento crítico das pessoas com minhas fotos, já estarei
satisfeito. Outro motivo que me mantém nessa jornada é que tenho recebido
mensagens de pessoas que passaram a admirar mais a arte depois que passei a
publicar meus trabalhos. Isso me mantém querendo aprimorar meus conhecimentos,
minha visão, minhas técnicas e, consequentemente, todas as histórias que conto
nas minhas fotos.
Você
disse que fotografa para transformar o mundo. O quão transformadora pode ser
uma imagem?
A fotografia, assim
como todos os tipos de arte, tem o poder de transmitir emoção às pessoas, sendo
prazer ou incômodo. A fotografia, por si só, traz um conceito intrínseco, à
primeira vista é possível ver a realidade, mas o conceito só aparece quando a
imagem é esmiuçada pelo alinhamento olho, cérebro, coração. Gosto sempre de
relacionar minhas fotos com algum contexto, conceito ou frase que exprima meus
sentimentos no momento em que fiz a imagem. As pessoas são sensíveis, se conectam
facilmente com a arte e são tocadas, os pensamentos e atitudes podem ser
modificados.
Seu
pai já foi pescador e até hoje mantém uma forte ligação com o Rio São
Francisco. Você produz ensaios sobre a cultura barranqueira, como o excepcional
Poesia e Sugestão. O que interliga
esses dois fatos?
Meu pai me ensinou a
respeitar a natureza e as pessoas, ele é meu mestre. Eu, como um bom discípulo,
sigo os ensinamentos dele, construindo meu próprio caminho e respeitando os
valores ensinados. Por isso, tenho essa forte ligação com o Rio São Francisco,
pois nasci e vivi como barranqueiro. Hoje sofro com os maus tratos que a
natureza vem sofrendo, em especial, o nosso Velho Chico, pois me sinto como se
fosse parte dele.
O
ensaio Poesia e Sugestão foi muito
especial, pois envolveu um contexto literário totalmente engajado à história da
modelo e pude contar com a participação da Prof. Bethânia Passos na elaboração
do conceito. Além disso, conseguimos encaixar dois elementos que são marcantes
para mim, pôr do sol e o Rio São Francisco. O fato é que estou mais inspirado
quando estou no ambiente barranqueiro.
Do ensaio Poesia e Sugestão
Atualmente,
você vive em Belo Horizonte. Como é Pirapora vista de longe? O que você aprende
com a distância?
Pirapora vista de longe
é saudade, é vontade de retornar e de poder trabalhar para cuidar dessa terra
que sofre com o descuido de políticos. Quando não estamos inseridos diretamente
em uma situação e apenas a observamos de longe, temos uma percepção diferente,
não melhor, nem pior, apenas diferente. Estando de fora, eu valorizo mais as
belezas naturais e enxergo algumas oportunidades de melhoria na cidade que
fariam muita diferença na vida dos barranqueiros.
Quais
as melhorias mais urgentes?
Vou
citar três pontos críticos que enxergo com clareza e que necessitam de uma
atenção especial. Primeiramente, a Ponte Marechal Hermes, que é maravilhosa, um
patrimônio tombado, e se encontra em uma situação deplorável. Há alguns anos,
se não me engano 24 de dezembro de 2012, uma criança caiu entre as tábuas da
ponte e morreu. Poderia acontecer com qualquer um de nós. Além disso, os apoios
da ponte, assim como toda sua estrutura estão comprometidos pela oxidação, sem
falar na iluminação precária.
Outro ponto é o próprio
Rio São Francisco. Qualquer um que viveu a sua beira pode perceber a mudança
para pior. Diversas ilhas estão se formando e a margem está avançando sobre o
leito do rio. O assoreamento está aumentando, há muito lixo e o canal que passa
no Barreiro, também passa no Saae, mas deságua no Rio sem nenhum tipo de
tratamento. O Rio é responsabilidade de todos e devemos cobrar que seja
cuidado.
Por fim, o
desenvolvimento urbano. Percebo que Pirapora teve uma pequena evolução desde
que saí de lá, mas o crescimento poderia ter sido bem maior. Tenho muita
vontade de voltar, mas não posso contar com isso, sabendo que não tem um
mercado de trabalho que possa me absorver. Pirapora tem muitos artistas e
existem duas opções para eles: ou se jogam no mundo ou vão morrer sem nem mesmo
serem vistos pelos seus próprios conterrâneos.
Qual
é a sua melhor fotografia?
É difícil falar em melhor fotografia, mas uma das
que mais gosto é esta:
Eu não tinha pretensão
de ser fotógrafo profissional quando a fiz, assim como outras fotos de que
gosto muito. Essa fotografia me dá a sensação de ser o próprio Rio.
***
Entrevista:
Douglas de Oliveira Tomaz.
Grande artista de olhar sensível cujo trabalho me toca de forma especial. Pessoa maior ainda.
ResponderExcluirMuito obrigado Rafael! Abraço!
ExcluirOrgulhosa, muito orgulhosa, sem palavras grande artista conterraneo!!
ResponderExcluirAmo fotografia, Rio sao Francisco e claro Pirapora!!!!!!!!!!!!!
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