quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Faço frete


Preciso destes cacos aqui. Tudo o que você precisa é de um documento em branco e de cortes. O caderno de anotações agora tem capa amarela, o sol se desbotou um pouco mais no caderno, nos cabelos dela. Ouço gritos ao redor, juro que ouço. Mãe, você não pode me culpar por não ouvir. O alto do sapato no corredor da empresa. Viro o rosto, olho. Cancelo o documento novo. Passo a passo.

Hoje compreendi. Há uma cabeça plantada no jardim. Ao redor são flores. Toca um samba sem parar naquela sala. Não entro. Trabalho. O caderno agora tem capa amarela, os cabelos dela. É poeta, articulei. Balança os cabelos, sopra a espuma, é poeta – alguém me diz. Hoje compreendi. Escrever é assistir à minha própria ausência.

Existe uma cúmplice dentro de cada poeta. Uma irmã. Preciso deste ruído aqui. Aquelas sombras ficam onde estão, não mexa. Invoco a multidão de silhuetas. Seu nome é ser cabeça plantada no jardim. Corpo plantado. Poeta corta árvore com navalha.

Os passos me espreitam. Interrompo a derrubada. Preciso de violência. Todo texto é casa, todo corpo é texto. Você é a casa que desaba, eu sou a casa que endureço. Ela é poeta, não mora. Preciso de violência e de uma ilha, não mexa. Dentre as portas abertas, a única porta aberta é a porta do texto. Dentre as estradas. Enrolem, por favor, plástico bolha no texto.


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Douglas de Oliveira Tomaz, 23 anos, é autor do blog pessoal www.abrigosdevagabundo.blogspot.com.br, foi premiado pelo concurso literário do Clube de Escritores de Ipatinga – MG (Clesi) e possui textos seus publicados pela Revista Jangada e Conhecimento Prático - Literatura. Em 2015, lançou de modo artesanal seu primeiro livro de poemas: Escorre. Atualmente, mora em Belo Horizonte, onde escreve seu primeiro livro de contos.


Ilustração: Vinícius Ribeiro (http://pensamentoilustrado.tumblr.com/)

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